Marguerite Duras tem um livro (seria um conto?) chamado A Dor. Nunca o li. Mas o título sempre me intrigou. De que dor falaria ela para traduzi-la tão grande ao público? Uma dor de perda? De remorso? Culpa? Ódio?
Até há pouco, não havia tido nenhuma dor assim, tão grande e pessoal. Ainda não experimentara esse sentimento tão fundo e cheio de vazio... é uma presença tão forte que dói no corpo. Curva as costas, altera o rosto, muda as feições... Me olhava no espelho e não me via. Era outra mulher. Velha, pesada e lenta. Uma centenária cheia de... dor!
E a dor também refletia ali. Entre as pernas, onde me tomou um frio poderoso. Frio de morte – morte como ausência. Saudade antecipada? Não, ainda não era. Antes a lembrança dolorosa de quem jamais haveria de contemplar vivo novamente. Ali, entre as pernas de outra mulher, começara minha vida. Agora, a vida me levava uma parte de mim que existia em outro corpo ou, antes, uma parte de outro que me fizera e me habita nos meus genes, no meu jeito, no meu polegar esquerdo.
Essa herança vai permanecer em mim, compactar-se na integridade do meu ser, integrar-se no meu universo interior. Sou resultado dessa parte de mim – meu pai – e agora só posso visitá-lo em minha memória. Ainda que traga boas lembranças e isso torne a dor menor, não há como encher o vazio. Ele vai ficar ali, reminiscência, como prova inconteste de minha história: sangue e carne, pensamento e afeto.
Assim como vai ficar a lembrança dela à beira da caixa de madeira, não tão forte, não tão sóbria: frágil, enrugada, grisalha... tão terrivelmente humana que também dói e eu a quero suspender nos braços e levá-la até ele, como se pudessem transpassar todas as dimensões e superar todos os limites para se encontrarem novamente por um instante e, enfim, se compreenderem como amigos, parceiros e amantes. Gente. Minha gente.
sexta-feira, 16 de outubro de 2009
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