quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Menina Marília



Pequenina, por enquanto você é somente uma ideia e um nome para mim. Porque, de você, ainda temos apenas isso. Você cresce no ventre de sua mãe, se prepara para ver a luz do mundo, suas flores e anoiteceres. Vai, em breve, saber o que é respirar com os próprios pulmões e esticar o corpo para tomar posse de seu espaço no mundo. Mas, por hora, você ainda é um grande feixe de células, um grande emaranhado de expectativa – um Ser se fazendo em silencio, em meio à carne de outra vida que se faz passagem, abriga com generosidade a iniciativa de trazer nova vida ao mundo. Você já tem nome de poema e de cidade. Pode ser tão grande quanto um ou outra. Pode ganhar o mundo ou vencer somente em sua própria terra. Tornar-se tão grande quanto a mágica da poesia ou ainda maior, gigante mesmo, dentro de si mesma. Tudo vai depender, Marília, do que você escolher. Posso garantir que seu pai é um bom homem. Bom de fato, bom na atitude e na intenção. Isso, pequena, num mundo de mesquinharias e misérias, é um tesouro incalculável. Desejo que você tenha olhos para enxergar essa riqueza impalpável. E que tenha uma grande alma – leve e radiante, cheia de coragem e, sempre, alguma irreverência para teimar em seguir adiante mesmo que pés, mãos e cabeça digam que pode não ser possível. Isso poder fazer toda a diferença, Marília. Desejo ainda que seu pai tenha amor por você, mas também respeito para saber quando desistir, gentilmente, de ser somente pai e se tornar somente um amigo, silencioso, mas atento. Desejo ainda que ele tenha tempo e alegria para você. E que possa pensar em organizar piqueniques para os seus finais de semana ou um banho de mar nas tardes preguiçosas de verão. Que saiba observar seus movimentos e ler seu sentimento. Não, não desejo que ele seja um super-herói, mas que tenha um espírito incansável para acompanhar você se fazendo gente, fazendo-se também a ele mesmo um grande e afetuoso pai. Porque você vai perceber, Marília, mais frequentemente do que se pensa não são os pais que fazem os filhos... antes disso, são os filhos que tornam pessoas comuns grandes pais. A palavra que melhor define essa construção é generosidade. Oferecer a chance de a vida cumprir os destinos de Deus só pode ser um ato de grande amor. Seja feliz, Marília. Mas, antes de tudo, procure tornar-se o que você realmente é. Isso pode ser difícil ou doloroso, algumas vezes. Mas, com certeza, é o melhor caminho para ser feliz.

*crônica para Marília, filha do amigo e médico Camilo Fernandes, quando ainda estava em gestação por sua mamãe, Jú.